sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O dia que conheci o Theatro Municipal do Rio de Janeiro



Ontem, por volta de 19h, saí de casa para ir ao Rio. Já no ônibus, olhei as sessões nos cinemas da Zona Sul. Nenhum horário para um filme.

Li no Rio Show que teria Gonzaga no Odeon às 21h. Desci às 20h na Cinelândia disposto a fazer hora, mas vi que o cinema estava prestes a fechar.

Não entendi bem por que cargas d'água o Odeon estava fechando tão cedo, mas nem procurei saber. Fui andando a esmo pela Praça Floriano.

Chegando na esquina com a 13 de Maio, notei o mar de gente que se aglomerava às portas do Theato Municipal.

Sentei num banquinho que por ali existe e, com certo temor de ser assaltado, peguei o celular para fazer uma foto daquele belíssimo teatro iluminado.

Fiz a foto, publiquei no Instagram e pensei, ao ouvir um cambista anunciando o valor do ingresso do espetáculo: por que não entrar?

Já que eu nunca tinha entrado no Theatro Municipal, o fato de estar de bermuda não me desanimou.

Então, subi aquela pequena escadaria, não como pagador de qualquer promessa, mas como curioso, mesmo. E me dirigi a dois caras de terno.

Perguntei a um deles onde ficava a bilheteria. Ele me disse que à minha esquerda, mas, por conta própria, me advertiu: de bermuda não pode.

Aí pensei: pena, dei mesmo viagem perdida. Mas fiquei por ali, mãos dentro do bolso, pessoal entrando, mar de gente diminuindo, e eu me destacando de verde.

E os cambistas anunciavam em bom tom o preço e setor dos ingressos que dispunham. Um deles, ao me ver com cara de fuinha, se aproximou.

Me ofereceu um ingresso por R$50. Setor: frisas. Dizia ele que a visão era privilegiada, mas eu realmente não fazia idéia do posicionamento.

Eu disse que não compraria por estar de bermuda, no que o cambista, sem pestanejar, anunciou, empolgado: EU TE ARRUMO UMA CALÇA.

Gargalhei, totalmente ruborizado. Ele falava sério, bem sério. Espetáculo já começara e ele, óbvio, não queria morrer com o ingresso na mão.

Fiquei em cima do muro. Como assim o cambista me empresta uma calça? Que calça, cara?, perguntei. Te arrumo, pô, te arrumo, repetiu.

Ele pediu adiantamento de R$10. Peguei a carteira, incrédulo com o que acabara de fechar. Entreguei os R$10 e, juro, pensei nos meus netos.

Ele pegou o dinheiro e, já correndo, pediu que eu o aguardasse. Porra, onde mais eu iria? Avistei-o falando com um cara, que puxou SEI LÁ DE ONDE uma calça.

Em menos de um minuto ele voltou com uma calça bege clara. As portas da frente do teatro já estavam fechadas e comecei a temer pela minha entrada.

E perguntei por onde entraria. Pela lateral, disse ele. Peguei a calça, fui num cantinho e, sem olhar ao redor, vesti por cima da bermuda.

Eu estava rindo pra caralho. Não podia acreditar no que estava fazendo. Mas foda-se, pensei. Tudo no improviso é mais gostoso. Bem mais!

Já com a indumentária nova, espiei rapidamente se a calça estava suja. Não estava. Ficou justa na cintura, mas parecia UM BALÃO nas minhas canelas.

Com certeza eu repararia em alguém com um calça tão larga. Tímido, temi pela minha reputação. Que vão pensar? Ah, foda-se, é escuro lá dentro, minimizei. 

Fomos até a entrada lateral do teatro. Olhei o ingresso com atenção. Mas como ter atenção numa hora dessas, de tanta correria e improviso?

No fundo eu estava excitado. Que puta espírito aventureiro, pensava. Mas o ingresso indicava "estudante". E se me pedirem carteirinha?

Pedi que o cambista me aguardasse. Entrei no teatro, finalmente. Dei o ingresso ao rapaz e, leigo, perguntei: pode entrar ainda? O cara sinalizou que sim.

Já "garantido", falei já volto e saí para pagar o restante ao cambista. Peguei duas notas de R$20 e lhe entreguei. Com os R$10 de antes, R$50, como havíamos 

tratado.

Mas eu tinha duas notas de R$50 na carteira, além das duas de R$20. Como estava trêmulo, permiti que ele visse. Então ele cresceu o olho e pediu uma delas, 

que, somada aos R$10, totalizava R$60. 

Então eu chorei: tratamos por R$50. Ele: fecha R$60, cara, o setor é nobre. Mas você disse R$50, insisti. Mas ele me persuadiu.

Pediu, então, que eu lhe desse R$50 e que ele me voltaria R$30. Nervoso, me enrolei. Dei a nota de R$50 e ele me voltou R$30, mas: e as duas de R$20 que eu 

já tinha dado, mais a de R$10? O ingresso acabou saindo por R$70. Só fui perceber isso HOJE!

Ele me enrolou, óbvio. Rato de rua. E, mesmo sendo comerciante e lidando com dinheiro e negociação diariamente, fui envolvido.

Não considero prejuízo porque adorei o espetáculo. E só notei que era ballet quando, lá dentro, sentado, acendi a lanterna do celular sobre o ingresso.

Antes de entrar no teatro, perguntei ao cambista o que faria com a calça. Deixa com o pipoqueiro, ele gritou, já distante.

Por SMS, contei tudo pra Tatá. Ela ria muito. E, enquanto isso, o espetáculo rolava e um cheiro ruim exalava. Era da calca. Ou o cecê do sujeito a minha 

frente?

Eu ralava a mão pela calça e cheirava. Cheiro esquisito que, quando confrontado com o do cecê do careca da frente, ficava pior.

Digamos que o cheiro que exalava era misturado. Calça + sovaco de cebola do careca = odor que, aparentemente, só eu senti, porque ninguém ao meu redor 

parecia incomodado.

O espetáculo? O Quebra Nozes. Monótono no início, adorável da metade pro final. Aplaudi ao fim e, antes que todos saíssem, tomei a frente.

Pensei em tirar a calça no banheiro do teatro, mas acabei saindo vestido. Fui ao banheiro do Amarelinho (bar/restaurante conhecidíssimo no Rio) poucos metros 

adiante, tirei e dobrei.

Voltei à porta do teatro, caminhei até o pipoqueiro e expliquei que um rapaz pegaria a calça com ele, sem dizer quando, até porque eu não sabia. Acho que ele 

não entendeu absolutamente NADA do que eu disse, mas acenou positivamente com a cabeça.

Então, pus a calça em cima da barraquinha de pipoca e fui embora, rindo e pensando na divertidíssima noite que acabara de ter.


4 comentários:

  1. Muito bom! hahahahahaha

    ResponderExcluir
  2. Teatro Municipal, Balé Clássico e um Causo desse? Sua noite foi espetacular mesmo e com Custo X Benefício baixíssimo. Ter uma ESTÓRIA dessa para contar aos netos, é único. Melhor que do que isso só se a calça escrevesse. Na próxima temporada ela verá Aida, Momix e Carmen. Abraços.

    ResponderExcluir
  3. Maneiro cara, vai ter essa história para contar a sobrinhos, filhos, netos, etc... Se não fosse no Rio, não seria em nenhum outro lugar do planeta.

    ResponderExcluir